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quarta-feira, 30 de abril de 2014

HAVERIA OFERTA SE NÃO HOUVESSE UMA PROCURA?

Este ensaio objetiva convidar a leitoras e leitores a aprofundar o que pode significar “A venda da virgindade” de algumas mocas e até indígenas, que está ocupando vários espaços mediáticos nestes últimos tempos em nosso país. “Na cidade que possui a maior população indígena do país, meninas indígenas são exploradas sexualmente e chegam a trocar sua virgindade por doces, frutas e celulares.” (Folha de São Paulo 24/11/12)



A manchete propositalmente escandalística desafia e nos defronta com o corpo das mulheres, de como ele foi visto ao longo dos séculos. “O corpo feminino reina e padece em diversas épocas da história. Território há muito considerado de posse cultivo masculino, "vaso receptor", ora sagrado, ora laico, O corpo das mulheres foi várias vezes identificado por seus mistérios e forças.” (DE MATOS S. Izilda Maria e SOIHET, Rachel, (2003) “O corpo em debate”).

Esta noticia nos obriga a dar um passo a mais no aprofundamento sobre do que está por traz desta “venda”, que até em alguma ocasião como ver mais adiante tomou as dimensões  de “leilão”

Segundo uma postagem do dia 7 de novembro de 2012 titulado:  “Socorro! a menina que leiloou a virgindade é estrela de desfile da Fashion Rio” diz como  ‘A moda apela pesado na hora do marketing e isso não é novidade para ninguém. A mesma indústria que premia meninas anoréxicas (não vamos fingir que não é isso porque é) acaba de dar o prêmio máximo para uma menina que leiloou sua  para conseguir ESPAÇO NA MÍDIA.’

É interessante perguntarmos: Virgindade para quem e para que? As mulheres continuam sendo esse “vaso receptor”, essa posse do masculino que falam as autoras acima nomeadas? Será que “Em meio à transformação dos corpos femininos em espetáculo para homens e terreno de reprodução dominado por eles, como sublinha Michelle Perrot, emerge a mulher sem direitos sobre o próprio corpo, contida, ou quase sem corpo” ou, talvez, as mulheres com um corpo fragmentado, um corpo obrigado a responder a uma procura geralmente masculina dentro de um sistema pornográfico, patriarcal e hegemônico no marco de um capitalismo neoliberal excludente? 

Na perspectiva da exploração sexual dos seres humanos e da chamada ‘indústria sexual’, Richard Poulin no seu artigo: “Quinze teses sobre o Capitalismo e o sistema mundial de prostituição vem reforçar o que estamos falando: “ A prostituição adquiriu um caráter de massa e espalhou-se pelo mundo inteiro, junto da pornografia .As cifras dessas industrias são colossais: estima-se que em 2002, a prostituição gerou lucros de 60 bilhões de euros e a pornografia, 52 bilhões(Dusch, 2002, 109 e 101).”  Isto traz como consequência, a chamada “mercantilização dos corpos”. Ainda mais, nos animaríamos a dizer de algumas partes desse corpo, só aquelas que tem a ver com a sexualidade das mulheres reduzida só a genitalidade.

No marco desta reflexão cabe nos perguntar: Haveria oferta senão houvesse uma procura? Quais são as agências que impulsionam essa procura?. É conhecido por todos/as que estas agencias tem donos, em sua grande maioria homens, que visam o lucro com métodos de exploração cada vez mais sofisticados e desumanos. Ouso afirmar que se está impondo um estereótipo de conquista da fama, da celebridade e do dinheiro imediato sem precedentes.  Para este estereótipo as mulheres, já desde meninas, vão sendo empurradas, “treinadas” e incentivadas das mais diversas maneiras. Nisso o papel relevante pertence ao quarto poder da mídia. Ela é funcional aos objetivos deste sistema capitalista neoliberal. Nesta moldura mundial globalizada, a superprodução pornográfica vai se tornando algo “quase natural” e, ás vezes, é promovida como chance de obter lucros rápidos e conquista dessa fama que se impõe.

Isto pode ser verificado no marco de um fenômeno novo e preocupante que vai de mãos dadas com as questões que citamos acima e que desembocam hoje, no Brasil, no chamado turismo sexual e tráfico de mulheres, crianças e adolescentes para a exploração sexual. “Segundo o Ministério de Turismo aproximadamente 500.000 turistas estrangeiros devem visitar ao Brasil durante a Copa do Mundo e mais dezenas de milhões de pessoas brasileiras devem movimentar-se entre as cidades e a sede.”

Para propiciar ainda mais a reflexão e debate dos (das) leitores (as), vem à tona outro questionamento: colocar à venda e até promover um leilão da virgindade como é o caso de Nina Lemos de Itapema (Santa Catarina) não será mais uma das estratégias absurdas e acirradas para atrair turistas nos megaeventos (Copa 2014 e Jogos Olímpicos 2016) e assim garantir  lucros volumosos com a exploração sexual e econômica dos corpos dos seres humanos e, sobretudo, das mulheres? “Os megaeventos utilizam da mercantilização do corpo da mulher para lucrar com a indústria do sexo e o tráfico de mulheres” (Mariana Cristina Moraes da Cunha Integrante do Fórum Estadual de combate a violência contra a mulher RJ).

Vale salientar que no pacote turístico que as agências turísticas divulgam coloca-se o conjunto: praia, sol e MULHERES BRASILEIRAS como fossem  três fenômenos da natureza brasileira tão rica e disponível. O corpo seminu da mulher é frequentemente dentro desta moldura propagandística dos bens naturais.

 Sem dúvida alguma pensamos que estas provocações e questionamentos podem nos ajudar a ampliar a visão sobre este tema e temáticas afins. Com certeza, refletir sobre isso aguçará nossa consciência crítica. E nos orientará a utilizar chaves essenciais alternativas para desconstruir qualquer tipo de discurso propagandístico. Vale a pena, a cada fenômeno que aparece sempre se perguntar: O que se diz? A partir de onde se diz? Para que e por que se diz? A mídia jamais é ingênua e, por tanto, quem  a recebe deve cuidar-se para não se deixar envolver pela ‘ingenuidade.. O “quarto poder” assume os objetivos e metas claras em tudo e, no que se refere à exploração sexual e econômica dos corpos dos seres humanos, ele é eficientíssimo. Com alto grau de criatividade, provoca e tenta seduzir a cada momento. Daí a necessidade de construir posicionamentos definidos e críticos para não compactuar como com seu projeto desumano que mercantiliza os corpos, sobretudo, das mulheres.

Ingenuidades moralistas e de outro tipo podem levar as pessoas a ‘atirar a primeira pedra’ nas protagonistas que mais aparecem e não ver ou deixar na sombra, as causas primeiras e principais.

Manuela Rodríguez Piñeres



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