O Tráfico de Pessoas, uma realidade definida pelo Papa Francisco como mercantilização da vida, é um desafio cada maior na sociedade atual, também para a Igreja. No Regional Norte 1 da CNBB, o enfrentamento do Tráfico Humano e da exploração sexual de crianças e adolescentes tem sido assumido desde 2011 pela Rede Um Grito Pela Vida.
A pandemia da Covid-19 tem provocado um aumento dessa realidade, algo que tem sido abordado no encontro de formação organizado pela Rede um Grito pela Vida, que refletiu sobre “A realidade das violações dos direitos, abuso, exploração sexual, Tráfico de Pessoas e migração em tempos de pandemia no Regional Norte 1: junto a infância, juventudes e mulheres”.
Estamos diante de uma realidade sempre presente na vida da humanidade, presente na Bíblia, onde já são narradas situações de trabalho escravo, violências, violações de direitos e migrações, segundo Francisco Lima. Não podemos esquecer que história é construída por povos que dominam outros povos, fazendo com que sempre existiu a escravidão do povo.
A escravidão ao longo da história foi permitida durante séculos, era considerada legal e normal. De fato, o Brasil foi um país construído com indígenas e negros traficados, lembrava Francisco Lima. Hoje é uma realidade mascarada, disfarçada e invisível. O Tráfico Humano é a escravidão de nossa época, a mercantilização da vida em nome do lucro, onde pessoas são consideradas mercadorias, insistia o secretário executivo do Regional Norte 1.
Na sociedade atual, uma situação que tem aumentado com a pandemia, existem circunstâncias que facilitam o Tráfico Humano. Uma delas é a miséria diante da falta de emprego ou qualquer fonte de renda, também a ganância, que faz com que as pessoas busquem ter dinheiro sem limites, sem escrúpulos, algo que inclusive acontece por pessoas conhecidas. Junto com isso, outra circunstância é a impunidade, dado que é difícil que os criminosos sejam punidos.
Estamos diante de uma realidade que é a terceira atividade mais lucrativa no mundo, que rende 32 bilhões de dólares por ano. Uma realidade da qual participam muitas pessoas, de toda condição, que é um atentado contra a dignidade da pessoa, segundo Francisco Lima. Existem diversas modalidades desse crime: mendicância, exploração sexual, adoção irregular, servidão doméstica, casamento servil, trabalho escravo, atividades criminosas, venda de órgãos, que são expressões do Tráfico Humano.
A Amazônia é uma das rotas principais do Tráfico Humano no mundo. Francisco Lima refletia sobre a situação dos ribeirinhos e indígenas nas cidades, muitas vezes nas periferias. Diante dessa realidade Jesus nos convida a acolher, dar de comer, cuidar, visitar. Ele lembrava como a Igreja tem buscado dar visibilidade e refletir essa realidade, sobretudo a partir da Campanha da Fraternidade de 2014. Em consequência disso, o Regional Norte 1 assumiu a Migração Forçada e o Tráfico de Pessoas como causa comum nas dioceses e prelazias. O Sínodo para a Amazônia, desde o processo de escuta, e Querida Amazônia, onde o Papa Francisco nos diz que “é preciso indignar-se”, tem ajudado a refletir e dar visibilidade ao Tráfico de Pessoas.
A pandemia tem aumentado a vulnerabilidade das vítimas. Nesse sentido, a realidade do interior nos mostra que existem muitos casos de gravidez precoce, de meninas de 12 e 13 anos, algo que está ajudando a conhecer o trabalho realizado pelo AJURI Amazônico. Estamos numa região onde muitas menores são forçadas a se casar, onde acontece um crescente aumento do trabalho infantil no interior e nas cidades. Na verdade, os dados são pouco conhecidos, um grande problema é a ausência de dados, também a precarização da rede de proteção e do seu funcionamento, dos CMDCAs e dos conselhos tutelares.
Diante dessa realidade somos chamados a olhar a realidade e se articular para transformar, afirmava Marcia Maria de Souza Miranda. A articuladora da Caritas Regional Norte 1, relatava as situações e dificuldades vividas neste tempo de pandemia, insistindo na necessidade de estender o olhar para o interior e trabalhar em rede. O desmonte das políticas públicas, uma realidade cada vez mais presente no Brasil, tem piorado a situação da população, relatava Márcia. Diante disso, a sociedade civil tem se organizado e garantido os direitos do povo.
Um desafio é levar as formações para o interior, onde quase não tem acesso à internet. Isso tem que levar a fortalecer as pastorais sociais, a cuidar da realidade de muitas jovens e adolescentes que para se manterem, no interior e na cidade, acabam caindo na exploração sexual e tráfico de drogas. Se faz necessário continuar animando as pessoas, para que não desanimem diante da realidade de desgoverno e os tantos desafios. É tempo de ousadia, simpatia e profetismo, de resgatar a pastoral de conjunto, para poder superar a pandemia do Tráfico de Pessoas e tantas pandemias presentes na Amazônia e no mundo.
Por: Pe. Luis Miguel Modino | CNBB Norte 1