Ajudar o povo a tomar consciência das situações de vida que fazem parte do seu cotidiano é o primeiro passo para construir um mundo melhor para todos, mas sobretudo para mudar a vida dos povos, de pessoas concretas que sofrem as consequências de uma sociedade onde tudo virou mercadoria, onde tudo tem preço, onde a vida vale pouco ou nada.
Mais uma vez a Rede Um
Grito pela Vida, seguindo o chamado que o Papa Francisco faz a ser Igreja em
saída, que se fez presente nas periferias do mundo, chegando num desses lugares
onde bem pode ser chamado de “terra sem lei”. A fronteira entre o Amapá e a
Guyana Francesa é lugar de passagem de pessoas que querendo uma vida melhor
acabam perdendo o controle da própria vida, que fica nas mãos de gente sem
escrúpulo que escraviza inocentes.
Neste ano em que a Rede
Um Grito Pela Vida comemora dez anos de caminhada, quer conhecer uma realidade
de fronteira onde ainda não tem um núcleo da Rede e animar a vida religiosa
consagrada para que pense na possibilidade de um trabalho em rede. Por isso as
referenciais da Rede Um Grito Pela Vida na Região Norte, decidiram como marco
dos 10 anos fazerem a experiência, nos dias 09 a 23 de julho de 2017, nesta
região. Estiveram presente as irmãs: Isabel do Rocio Kuss, Irmãs Catequistas
Franciscanas, Acre; Roselei Bertoldo, Irmãs do Imaculado Coração de Maria,
Amazonas; Valmí Bohn, Irmãs da Divina Providência, Amazonas; Maria de Jesus Borges
Costa e Josineide Maria da Silva, Irmãs de Notre Dame de Namur e Irmã Rosangela
dos Santos, Irmãs Missionárias de Maria, Xaverianas.
Os encontros com a Vida
Religiosa e as Pastorais Sociais no Amapá, onde foi apresentado o trabalho da
Rede e a realidade do Tráfico de Pessoas na Região Norte, tem mostrado o apelo
de acompanhar a vida das vítimas do abuso, exploração sexual e o Tráfico de pessoas.
Conhecer o trabalho que
está sendo realizado, como na Casa da Hospitalidade onde as irmãs, atendem 85
pessoas apartir do nascimento, portadores de deficiência, abusadas sexualmente
e abandonadas; e a casa Bethania, em
Macapá, também atendidas por irmãs que
acolhem atualmente 21 meninas, onde relatam os casos de violência, têm ajudado
a descobrir que o abuso, exploração sexual e o tráfico de pessoas estão cada
vez mais presente na sociedade e no Estado. Diante disso, urge iniciar um
trabalho organizado en rede.
Chegar no Oiaopoque é
uma verdadeira aventura, uma viagem em que o risco toma conta das pessoas. O
descaso dos poderes públicos se traduz em constantes atoleiros que fazem que
ninguém saiba quando nem como vai chegar no destino, que uma viagem de oito
horas se converta numa de vinte e oito. Nada que preocupe a quem anda de avião
e engana o povo com promesas que nunca serão cumpridas.
Muitas vezes são
mulheres indígenas as vítimas dessa violência irracional. Diante dessa
realidade as mulheres caciques e lideranças querem encontrar os meios para
proteger as aldeias e evitar que as pessoas se tornem vítimas desses crimes. Os
relatos das mulheres que participavam da oficina na aldeia do Manga ajuda a
sentir a vida sofrida de pessoas concretas, histórias que se repetem nas
visitas a diferentes comunidades de um e outro lado do Rio Oiapoque, em
território brasileiro e da Guyana Francesa, onde os euros dos cidadãos
franceses constroem grandes mansões, que atraem mulheres e adolescentes pobres,
que se tornam vítimas de estupros e abusos e que em muitos casos desaparecem
para sempre.
O trabalho tem que
começar pelas crianças, vítimas potenciais e reais de situações de abuso, como
acontece com as meninas e meninos das muitas aldeias e comunidades. As oficinas
ajudam as crianças e os adolescentes a se protegerem, através de materiais que
mostram histórias de abuso, exploração sexual e do tráfico, como “O Sumiço de
Carolina”.
O sofrimento ultrapassa
as fronteiras e o trabalho de prevenção, realizado pelas irmãs que moram no
Oiapoque, também tem que ir além dessas divisões que muitas vezes favorecem
àqueles que se aproveitam das vítimas. As promessas de trabalho nos garimpos da
Guyana Francesa são na verdade desculpas para a exploração sexual, de onde
algumas mulheres conseguem fugir, enquanto muitas são exploradas até morrer.
As margens do Rio
Oiapoque têm se convertido em lugar onde a violação dos direitos, drogadição,
alcoolismo, violência sexual são realidades que a gente vê a olho nu. Uma
realidade muito chocante, mas que infelizmente tem se naturalizado e que faz
que crianças e adolescentes sejam exploradas em prostíbulos que funcionam 24
horas, lugares de morte e destruição de vidas inocentes que sofrem as
consequências de uma sociedade que olha para o outro lado.
Mesmo diante de
situações de opressão nunca podemos perder a esperança, pois isso nos ajuda a
não desistir na lutar por um mundo melhor para todos. Nosso compromisso cristão
faz que mude a vida de pessoas concretas, que descobrem no olhar misericordioso
de Deus uma possibilidade de retomar uma vida plena e seu cuidado cheio de
Amor.
Por Luis Miguel Modino - Jornalisa
e Roselei Bertoldo - Rede Um Grito Pela Vida.
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